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Por 88 votos a 24, a Câmara dos Deputados chilena aprovou nesta quinta-feira (24) a redução das jornadas de trabalho em todo país. Esta foi uma derrota para o Presidente Sebastián Piñera (contrário à redução), e um reflexo da força do povo chileno que há cerca de 10 dias consecutivos vem mobilizando grandes protestos noticiados no mundo inteiro.
Mas o que há de errado com o Chile, considerado por muitos (inclusive o governo brasileiro) como um modelo a ser seguido? De fato, o PIB chileno (soma dos bens e riquezas produzidas no país) cresceu 4% no ano passado. O Brasil, no mesmo período, cresceu 1,1%, e a América Latina em média cresceu apenas 0,4%. Contudo, o PIB não mede a desigualdade.
É importante atentar que o Chile vive um momento difícil e que não começou agora, com os protestos. O que levou o país mais desenvolvido da América Latina a esse momento foram anos de uma política econômica desequilibrada. Um modelo neoliberal onde o acesso à saúde e à educação vem sendo cada vez mais privatizado e se tornando caríssimo, enquanto a desigualdade social só aumenta, e os valores das aposentadorias e direitos trabalhistas só diminuem. E é esse mesmo modelo que também está tomando o Brasil.
O projeto prevê que quem trabalha 45 horas semanais passe a fazer 40 horas (novo limite máximo) sem redução dos salários. A iniciativa agora será examinada pela Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados. O texto também ressalta que “nos países onde se implementou redução, a tendência generalizada mostra que o valor da produtividade média do trabalho aumenta consideravelmente.” Os limites da jornada de trabalho semanal vem sendo cada vez mais discutidos e alterados em vários países pelo mundo; no Brasil, a lei determina 44 horas.
Segundo a deputada de oposição Karol Cariola, co-autora do projeto, essa aprovação contribui para o país “avançar em uma agenda que ajude a superar a atual crise […] Quando o povo está mobilizado, projetos que representam seus interesses e demandas avançam mais rápido no Congresso”.
Neste cenário, não apenas os parlamentares de oposição como os do próprio governo estão mais atentos a ouvir as demandas do povo, e é um momento propício para conquistar direitos sociais básicos que ficaram pendentes desde a redemocratização do Chile, em 1990.
Os protestos culminaram após uma tentativa do governo Piñera de aumentar a tarifa dos transportes de 800 para 830 pesos (cerca de R$4,80), no dia 6 de outubro. Puxados pelos estudantes da capital Santiago, uma vez nas ruas o povo mobilizou demandas por reformas estruturais consideradas urgentes para combater a desigualdade no país. Isso porque o transporte consome a maior parte da renda da população mais pobre – justamente quem mais depende de ônibus e trens.
Depois disso, o governo cedeu e suspendeu o aumento da passagem. Mas não foi suficiente. Após o governo convocar o exército para repreender as manifestações, o movimento cresceu radicalmente, assim como os casos de violência. Ao menos 20 pessoas foram executadas em confronto com as forças policiais, o número de feridos é incontável, e mais de 1.500 foram presas. Prédios públicos e estações também foram atacados. Mas as manifestações pacíficas também aumentaram: somente nesta sexta-feira 424.000 chilenos foram às ruas.
Piñera assumiu ter “demorado em agir” e anunciou um pacote de medidas sociais, como a criação de uma bolsa para quem trabalha em jornada completa ganhando menos de 350 mil pesos (cerca de R$1.930). Em um país onde o salário mínimo equivale a R$2.255,00, o custo de vida também é mais alto, e é aí que a conta não fecha.